domingo, 6 de maio de 2012

Mãe

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Mãe:
Que desgraça na vida aconteceu,
Que ficaste insensível e gelada?
Que todo o teu perfil se endureceu
Numa linha severa e desenhada?

Como as estátuas, que são gente nossa
Cansada de palavras e ternura,
Assim tu me pareces no teu leito.
Presença cinzelada em pedra dura,
Que não tem coração dentro do peito.

Chamo aos gritos por ti — não me respondes.
Beijo-te as mãos e o rosto — sinto frio.
Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes
Por detrás do terror deste vazio.

Mãe:
Abre os olhos ao menos, diz que sim!
Diz que me vês ainda, que me queres.
Que és a eterna mulher entre as mulheres.
Que nem a morte te afastou de mim!

Miguel Torga

2 comentários:

Elvira Carvalho disse...

Quanta saudade não é verdade amiga?
Um abraço

Nothingandall disse...

Um belíssimo poema de dor, amor, saudade, angústia. Um que figura na minha antologia da poesia portuguesa (em que vários são de Torga, obviamente...)