sexta-feira, 28 de março de 2008

Dez réis de esperança

just one life
Se não fosse esta certeza
que nem sei de onde me vem,
não comia, nem bebia,
nem falava com ninguém.

Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos á boca
e viesse o que viesse.

Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das penas brancas
a cair impertinente,

Aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela,

Não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram, e não perceberam,

Essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule, flutuando
no pranto do desencanto,

Se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.

 

António Gedeão

Fotografia: www.paulocesar.eu - paulo cesar

10 comentários:

Isamar disse...

Um poema de um homem grande da poesia portuguesa acompanhado de outro grande do fado.
Excelente blogue o teu!

Beijinhosssss

Bem hajas!

Carla disse...

gosto muito deste poema
bom fim de semana
bjs

peciscas disse...

É, como já tenho dito muitas vezes, um dos poetas que mais amo!

Jorge P. Guedes disse...

Pois é o António gedeão não era só aquele da pedra filosofal nem da Lágrima de preta. Escreveu muito...e bem!
Boa foto!

Excelente o Camané, como sempre.

Um abraço.
Jorge P.G.

Anónimo disse...

Boa escolha, poesia do Grande Mestre.
Kiss e Bom Fim de Semana

Meg disse...

Ai Anamar, como és feliz por poderes publicar Gedeão! Um dos nossos grandes, que por estar publicado, há quem não goste de o ber nos blogues...afinal é só comprar os livros e ler.
Anamar, há de tudo na net, nunca desistas do que queres.
Um grande abraço amigo

Um abraço

Meg disse...

Não é ber, é ver nos blogues, sorry

Carminda Pinho disse...

Ana Marta,
Gedeão e mais um belo poema aqui postado.

Vejo que és grande admiradora do Camané, também gosto muito dele.
Morámos muitos anos na mesma rua.:)

Sabes que a mãe dele também canta o fado? mas ela é mais tipo amadora, ouvi-a cantar uma vez ali para os lados dos Estoril numa tasca, "O Cordeiro".

Beijos

Nothingandall disse...

António Gedeão um grande poeta. Votos de um bom fim de semana,

Paula Raposo disse...

Através da Isabel Filipe tenho o grato prazer de te visitar. Gostei de ter passado aqui. Beijos.