quarta-feira, 12 de março de 2008

PASTORAL

 

  Não há, não,

  duas folhas iguais em toda a criação.

   Ou nervura a menos, ou célula a mais,

   não há de certeza, duas folhas iguais.

    Limbo todas têm,

    que é próprio das folhas;

    pecíolo algumas;

    bainha nem todas.

    Umas são fendidas,

    crenadas, lobadas,

    inteiras, partidas,

    singelas, dobradas,

    Outras acerosas,

    redondas, agudas,

    macias, viscosas,

    fibrosas, carnudas.

    Nas formas presentes,

    nos actos distantes,

    mesmo semelhantes

    são sempre diferentes.

    Umas vão e caem no charco cinzento,

    e lançam apelos nas ondas que fazem;

    outras vão e jazem

    sem mais movimento.

    Mas outras não jazem,

    nem caem, nem gritam,

    apenas volitam

    nas dobras do vento.

   É dessas que eu sou ...

 

    MIGUEL TORGA

Fotografia: Gianluca Moret

1 comentário:

Jorge P. Guedes disse...

Mais um monumental poema de um dos meus poetas preferidos!

Torga consegue pôr-nos a dançar com as folhas, embalados por um doce vento presente na atmosfera criada perante o leitor.
Uma maravilha!

Um abraço e viva o bom gosto!
Jorge G.